A prevenção à lavagem de dinheiro, internacionalmente acompanhada pelo combate ao financiamento do terrorismo (sob a sigla PLD/FT), é associada a uma espécie de Programa de Compliance cujas medidas são voltadas à prevenção desses crimes. Embora a lei defina que determinadas atividades têm a obrigação de manter mecanismos preventivos à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, isso não deve ser interpretado como escusa para que outros setores não se atentem aos riscos de serem usados por terceiros para o cometimento desses crimes.
É importante lembrar que as melhores práticas internacionais preventivas focam no estabelecimento de medidas para mitigar os riscos aos quais uma atividade empresarial está exposta pela natureza da sua operação. Portanto, os fatores identificados na avaliação de risco da sua empresa que possam ensejar a lavagem de dinheiro ou o financiamento do terrorismo deverão ser tratados, independentemente de existir ou não uma regulamentação específica que imponha medidas preventivas a estes crimes. Eximir-se de proteger o seu negócio contra terceiros de má-fé facilitará aos estes mal-intencionados que se utilizem da sua operação de forma indevida.
Além disso, a Lei nº 12.846/2013 (popularmente conhecida como Lei Anticorrupção ou Lei da Empresa Limpa) estabelece a possibilidade de responsabilização da empresa por atos realizados por terceiros quando no interesse ou benefício da empresa, mesmo que não tenham sido a seu mando. Mais especificamente, essa lei expõe no seu artigo 5º, inciso III, como um ato lesivo à administração pública quando alguém se utiliza de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos ilícitos praticados.
Por essa razão, é importante que sejam formalizados os esforços razoáveis e proporcionais que demonstrem o empenho da empresa em mitigar riscos de ter a sua atividade utilizada para acobertar irregularidades.
Superado o ponto de que o dever de prevenir riscos de lavagem de dinheiro e de financiamento do terrorismo se estende a todas as atividades comerciais por questões de integridade corporativa, algumas atividades específicas listadas no artigo 9º da Lei nº 9.613/1998 devem adotar especial atenção aos seus mecanismos de PLD/FT. Essas atividades não apenas precisarão observar as medidas dos artigos 9º ao 11 dessa lei, como deverão atender às especificidades das normas emitidas pelos seus órgãos regulamentadores a respeito desse tema.
Por mais comum que seja falar de PLD/FT quando se trata do mercado financeiro, de capitais e de seguros, estas não são as únicas atividades reguladas com deveres específicos. Estudiosos atentos ao rol do artigo 9º perceberão que algumas atividades são tão quanto ou mais sensíveis em matéria de lavagem de dinheiro e de financiamento do terrorismo. Nesse caso, há atividades que possuem um órgão regulador próprio, responsável por editar tais normas, assim como atividades sem órgão específico, que serão reguladas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) por força da Lei nº 9.613/1998, art. 14, §1º.
A exemplo das atividades regulamentadas por órgãos específicos, temos mercado imobiliário, regulado pela Resolução nº 1.336/2014 do Conselho Federal de Corretores de Imóveis (COFECI), e o comércio de obras de arte e de antiguidades, regulado pelas Portarias nº 80 e 396 do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
A exemplo de atividades sem órgão específico, temos o comércio de joias, pedras e metais preciosos, regulado pela Resolução COAF nº 23/2012, e o comércio de bens de luxo e de alto valor, regulado pela Resolução COAF nº 25/2013. Fora as regulamentações específicas, as atividades reguladas pelo COAF também deverão se atentar às demais normas de PLD/FT que forem editadas com o intuito de abranger a todos os mercados sem um órgão fiscalizador determinado, como é o caso da Resolução COAF nº 36/2021.
É preciso conscientizar os colaboradores sobre as medidas que precisam ser adotadas em suas atividades para se prevenir dos riscos de lavagem de dinheiro e de financiamento do terrorismo. A falha na prevenção poderá ser a porta de entrada para que os terceiros mal-intencionados se utilizem do seu empreendimento para atividades ilícitas. Para evitar situações como essa, independentemente do rigor regulatório, será importante que um Programa de PLD/FT seja desenhado para atender especificamente às peculiaridades do seu negócio.
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Pedro Arantes é Head de Prevenção à Lavagem de Dinheiro na P&B Compliance, Certified Expert in Compliance pela Escola Superior de Ética Corporativa, Negócios e Inovação, associado à ACAMS (Association of Certified Anti-Money Laundering Specialists), Lead Implementer das normas ISO 37001 e 37301 pela ABNT, pós-graduado em Direito Penal Empresarial e Criminalidade Complexa pelo Ibmec e formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.